Engantchar

Engantchar – Tradição quaresmal ainda hoje (2015) praticada em algumas regiões, como Lamego, lugar de Ribelas. No princípio da Quaresma, rapaz e moça “engantcham” os dedos mindinhos, ou seja, prendem os dedos, em redondo (em gancho), um ao outro, fazendo uma aposta: cada vez que se encontrarem durante a Quaresma, o que mais depressa se lembrar, manda rezar o outro, dizendo “Engantchar, engantchar, p’ró Domingo de Páscoa, à hora que te vir, te mandar rezar. Reza!” O outro tem de rezar um Pai-Nosso e uma Avé-Maria. Ao longo da Quaresma, ao sabor dos momentos em que se encontram, vão mandando rezar o outro. Ganha a aposta aquele que, no Domingo de Páscoa, antes do nascer do sol, conseguir ser o primeiro a mandar rezar o outro. Se nesse dia nenhum deles o conseguir, vale a última vez que isso sucedeu, em qualquer dos dias anteriores. Se for a rapariga a perder, deve oferecer ao rapaz um “pito”, bolo regional com a forma de galinha (pito), que se vende na festa do S. Lázaro, Lamego, em Domingo de Lázaro, mas que continua disponível até à Páscoa. Se for ao contrário, o rapaz deve oferecer à moça a rosca, bolo de forma arredondada, também vendido no S. Lázaro. É notória a alusão erótica das denominações e das formas dos dois referidos bolos regionais. Resquícios prováveis de remotos cultos pagãos da fertilidade? É mais prudente falar de jogos de namoro ou tentativas de sedução recíproca. Antigamente, também se apostava uma laranja, fruto raro na região.

Na região de Coruche também havia esta tradição, com o mesmo nome e com poucas variantes. Aí dizia-se: “Enganchar, enganchar, p´ra amanhã mandar rezar, p’rá Páscoa dar folar, p’ró S. Miguel casar”. O mesmo, com poucas diferenças, ocorria na Beira Baixa. Igualmente em Mangualde. Também na Lourinhã e em Alenquer. Em Terras de Algodres, a tradição apresentava exactamente as mesmas características acima descritas em relação a Ribelas, Lamego – “Terras de Algodres”, de Mons. Pinheiro Marques, Lisboa, 1938. É provável que esta tradição, como tantas outras, tivesse dimensão nacional. A troca de doces com formas implicitamente sexuais entre rapazes e raparigas é tradição generalizada, como demonstra a oferta de passarinhas e sardões nas festas de N. Senhora da Conceição (8 de Dezembro) e de Santa Luzia (13 de Dezembro), em Guimarães, que representam declarações de amor e propostas de namoro. O mesmo em Vila Real nas Festas de S. Brás e de Santa Luzia (3 de Fevereiro e 13 de Dezembro), em que rapazes e moças, como promessas de amor, trocam doces regionais conhecidos por ganchas (caramelo em forma de báculo) e pitos (massa folhada com doce de abóbora).

N. B. – OS TEXTOS DESTA ENCICLOPÉDIA DAS TRADIÇÕES POPULARES ESTÃO SUJEITOS A DIREITOS DE AUTOR, PELO QUE A SUA REPRODUÇÃO, AINDA QUE PARCIAL, DEVERÁ INDICAR O NOME DO SEU AUTOR, JOSÉ ALBERTO SARDINHA.