Ranchos folclóricos

Ranchos folclóricos – Agrupamentos de carácter musical e coreográfico que têm por objectivo representar as antigas tradições das suas terras ou freguesias, através de exibições em público, nas quais os seus elementos se apresentam com trajes populares de antigamente, seja dos trabalhos do campo, seja de festa, seja de casamento, ou outros. Essas exibições são representações em palco da vida do povo em tempos passados: as danças, os trajos, os cantares e, mais recentemente, outras tradições populares.

A origem dos ranchos de representação folclórica tem sido objecto de polémica, reivindicando vários desses grupos a primazia cronológica, ou seja, o título e a honra de terem sido os primeiros do país a serem constituídos. Não é possível atribuir-se essa primazia a nenhum deles, porquanto, como iremos ver, uma coisa é a constituição formal de uma associação folclórica, com estatuto, sede e órgãos sociais, outra é todo o conjunto de circunstâncias que antecedeu a institucionalização legal desses agrupamentos. E este circunstancialismo, este primórdio, remete-nos para a segunda metade do séc. XIX, em que é possível encontrarmos numerosos exemplos de agrupamentos, mais ou menos espontâneos, mas em todo o caso ainda informais, actuando em vários locais, seja nas suas sedes de concelho, seja em Lisboa ou no Porto, seja até no estrangeiro, sem no entanto terem existência legal.

Como iremos ver:

Pelos dados disponíveis (Enciclopédia da Música em Portugal no século XX), o primeiro destes agrupamentos a possuir uma constituição formal terá sido o Rancho das Cantarinhas de Buarcos, Figueira da Foz, fundado em 1907. Nas duas décadas seguintes, outros se constituíram noutras regiões, particularmente na Beira Litoral e no Alto Minho.

Mas a constituição formal destes agrupamentos tem antecedentes históricos que remetem as suas origens para manifestações diversas de tempos mais recuados, que importa lembrar. Existem notícias da exibição de alguns grupos de rurais em Lisboa e até no estrangeiro, o que demonstra a formação e ensaio deste tipo de agrupamentos mesmo que para uma única e esporádica apresentação pública. Dá-se como exemplos: em 1898, exibiu-se em Lisboa um grupo de doze homens de Constantim, Miranda do Douro, executando a dança dos paulitos nas comemorações do 4º Centenário da Descoberta do Caminho Marítimo para a Índia, circunstância que veio a repetir-se em 1907; a apresentação de um grupo de minhotas, com um harmónio e um pandeiro, no XV Congresso de Medicina em Lisboa, no ano de 1906; a actuação em 1892, no Porto, a convite dos Bombeiros Voluntários, de um grupo de lavradeiras de Ponte de Lima, uma estúrdia minhota, que orgulhosamente mostrou aos portuenses a música, os trajos, as danças e cantares da aldeia; a actuação de camponeses numa feira comercial do Funchal em 1850; a exibição em 1934, de um grupo de pauliteiros de Cérsio, também das terras de Miranda, no Albert Hall, em Londres; a apresentação em Lisboa, nos finais do séc. XIX, de um grupo coral composto por homens de Vila Verde de Ficalho, perante a ilustrada assistência dos “Vencidos da Vida”; ou também, ainda do séc. XIX, várias notícias de grupos das aldeias interpretando as suas músicas e danças nas sedes do respectivo concelho perante visitantes ilustres, por vezes autoridades, civis, militares ou eclesiásticas, até o próprio rei.

Este costume de apresentação de danças e cantares de camponeses aos visitantes ilustres é prática antiga, de séculos, como refere Oliveira Marques no seu livro A Sociedade medieval portuguesa: “Também eram frequentes os espectáculos de danças populares, ante requintadas assistências palacianas. Contratavam-se vilãos que cantavam e bailavam suas modinhas tradicionais defronte do rei, de grandes senhores ou de convidados ilustres”. Em 1909, el-rei D. Manuel foi recebido apoteoticamente pelo povo de Amarante na celebração do Centenário da Guerra Peninsular e da defesa heróica da ponte sobre o Tâmega. Houve um cortejo cívico-militar e agrícola em que figuraram “velhotes lavradores, muito típicos, trajando à antiga e levando instrumentos de lavoura e raparigas do campo com seus trajes característicos”, bem como “um grupo de lavradores tocando e cantando” (jornal Flor do Tâmega de 11/7/1909).

Mas nem só estas apresentações perante figuras ilustres se situam na pré-história dos chamados ranchos folclóricos. Também contribuíram para a sua futura formação as exibições ocasionais de camponeses que ensaiavam para participar nas sedes concelhias em cortejos de oferendas (geralmente com fins de benemerência, a favor das Misericórdias, dos bombeiros locais, da construção do hospital, e ainda para obras das pequenas localidades, como o lavadouro ou o chafariz), ou para actuarem em cerimónias de carácter oficial, como inaugurações de obras públicas, ou simplesmente nas festas anuais do concelho. No princípio do séc. XX, era outrosssim habitual a organização das chamadas paradas agrícolas, espécie de demonstração das potencialidades agrícolas de uma região (à semelhança das feiras industriais), que incluíam desfiles de grupos de camponeses das aldeias, em seus trajos regionais, com carros de bois, e exibição das suas produções agrícolas, dos seus costumes e tradições, em jeito de cortejo etnográfico.

Também era – e continua, aliás, sendo – costume juntarem-se grupos de rapazes e raparigas de várias aldeias para se dirigirem às principais romarias das suas regiões e aí exibirem os seus trajos, cantos e danças ao som dos instrumentos tradicionais: eram os ranchos desta ou daquela aldeia, por vezes denominados “ranchadas de populares cantando e dançando” (chuladas na região duriense, em cujas romarias havia concursos de chuladas, com atribuição de prémio para a melhor). Nas Festas da Senhora da Agonia, Viana do Castelo, de 1905, houve um concurso “de estúrdias, tocatas e outros grupos musicais aldeãos com todo o seu feitio típico”; nas festas de 1907, ocorreu uma exibição de danças e cantares típicos por grupos de lavradeiras do Minho com seus costumes multicores; em 1910 houve um concurso de costumes típicos, descantes e danças regionais, formados por grupos das mais formosas raparigas das freguesias do concelho, as quais ostentaram os seus mais ricos trajes.

Houve também um fenómeno pouco conhecido: por vezes alguns entusiastas, com interesse económico ou não, organizavam pequenas representações musicais de costumes rústicos para apresentação junto de públicos urbanos. Era o caso assinalado por César das Neves a p. 287 do volume II do seu Cancioneiro de Músicas Populares: a respeito de uma chula reiseira da autoria de um “fecundo autor deste género de cantigas”, informa-se que esse autor cantava a solo e dirigia um grupo coral que se vestia “a carácter” quando tomava parte em festas populares, mais se adiantando que “a primeira vez que cantaram esta chula, andavam vestidos com palhoças como os agricultores do norte de Portugal em dias de Inverno”. Este tipo de apresentações musicais andava frequentemente associado à representação teatral, visto que esses agrupamentos actuavam também nos teatros, nas conhecidas récitas populares. São conhecidas fotografias dos primeiros decénios de Novecentos figurando os participantes nessas récitas, muitos deles vestidos com trajos regionais, obviamente por terem executado danças ao longo das peças teatrais.

Mas um outro factor contribuíu ainda para o nascimento dos ranchos de representação folclórica: trata-se da velha tradição lusitana das danças de rua. Eram espectáculos músico-coreográficos que se exibiam nas mais diversas circunstâncias, sobretudo por ocasião das mais importantes festividades e cerimónias civis ou religiosas. Havia grupos de populares relativamente estruturados, preparados e ensaiados, alguns mesmo com organização empresarial, para tocarem e dançarem em público. Sousa Viterbo chega a dizer que, no séc. XVII, devia haver um corpo de danças em cada povoação portuguesa. Anteriormente, já Gil Vicente, lamentando o desaparecimento de algumas tradições nacionais, lembrava os tempos em que havia dez folias em cada aldeia (releve-se a hipérbole ao dramaturgo). Depois do advento do liberalismo e da consequente abolição das corporações, bem como da intolerância religiosa da I República, as procissões perderam a importância e o brilho que anteriormente ostentavam e deixaram de integrar as danças que, até então, eram motivo de espectáculo e atracção, sobretudo nas festividades do Corpus Christi (vide).

Perdidas as principais fontes de procura, regulares e boas pagadoras (a Igreja e as corporações, bem como, em certa medida os municípios), os grupos de populares que ensaiavam e interpretavam as exibições músico-coreográficas passaram a orientar as suas actividades para outras ocasiões, como, por exemplo, a principal festa do concelho, os santos populares de Junho, os cortejos de oferendas para fins de benemerência, mas sobretudo para o Entrudo. Entre os Reis e o Entrudo percorriam as aldeias, vilas e cidades exibindo as suas danças. Apresentavam-se devidamente trajados e bem ensaiados, com instrumentos musicais e desenhos coreográficos variados e vistosos. Para esse efeito, foi escolhida a música e a coreografia das contradanças, razão por que esses agrupamentos ficaram conhecidos por contradanças (vide).

Nas povoações mais modestas também existiam estas exibições coreográficas de rua, mas aqui a finalidade não era a obtenção de pagamento, antes a afirmação da sua terra ou freguesia perante as vizinhas através da apresentação de música e dança bem ensaiada com trajos vistosos. Este fenómeno das contradanças revestiu carácter nacional e persistiu até aos nossos dias (em certas regiões, estes grupos tinham outros nomes, como rabelas (vide) na região duriense, ou vareiras em Terras de Basto e Vila Real – vide Vareira).

Muitos ranchos folclóricos representaram o prolongamento destas contradanças de entrudo (José Alberto Sardinha refere ter ouvido, na Beira Baixa, a seguinte observação: “as nossas contradanças de antigamente eram o que são hoje os ranchos folclóricos”; e também, em Bisalhães, Vila Real, de pessoas que tinham integrado a dança entrudesca da vareira nos finais dos anos 40, dizerem que actuavam bem trajados e orgulhosos, em cima de um estrado “como agora fazem os ranchos”). Na sua pesquisa estremenha, o mesmo investigador verificou que uma enorme percentagem dos ranchos folclóricos dessa província nasceram dos grupos que se formavam no entrudo para exibição coreográfica.

Na génese dos ranchos folclóricos podemos, assim, detectar, em resumo, a convergência de vários fenómenos:

1 – apresentação de rurais e suas danças e trajes perante visitantes ilustres na sede dos respectivos concelhos;

2 – deslocação desses grupos rurais a Lisboa para abrilhantar certames da mais variada natureza ou simplesmente a convite de particulares ilustres;

3 – exibição de jovens das freguesias rurais na vila ou cidade cabeça de município, na festa do concelho, ou em cortejos de oferendas, também na sede do concelho, ou ainda nas chamadas paradas agrícolas;

4 – deslocação das rusgas das aldeias às romarias e exibição dos seus talentos musicais e coreográficos no caminho e no arraial;

5 – formação de grupos trajados para interpretar danças regionais nas mais variadas circunstâncias, como era o caso das festas das suas próprias terras ou nas récitas populares

6 – contradanças de entrudo, rabelas e vareiras.

Os populares ensaiavam para se exibirem em todas essas ocasiões (ou melhor, em cada uma delas e apenas com esse objectivo concreto), surgindo depois a ideia de, com os mesmos trajes, músicas e danças, continuarem a apresentar-se ao público com regularidade noutras ocasiões durante o ano, até que essas actuações, pela sua frequência, exigiram ensaios regulares e conduziram à institucionalização, ou seja, à constituição formal de ranchos folclóricos.

Em quase todos esses tipos de manifestações era já visível uma certa dose de bairrismo, de orgulho ou vaidade em bem representar as suas terras, com bons trajos e coreografias vistosas. A par destes objectivos, existia já nalguns meios a consciência de que, estando as tradições populares músico-coreográficas a desaparecer inexoravelmente nos seus locais de origem, seria importante dá-las a conhecer e conservá-las através de exibições públicas. Em geral, pois, eram generosos os intuitos que animaram os fundadores dos primeiros ranchos de folclore.

A fase fundacional dos ranchos folclóricos decorreu, pois, ao longo das últimas décadas do séc. XIX e primeiras do séc. XX, o que desmente totalmente a asserção de que eles teriam sido criados pela política cultural do Estado Novo, que os teria condicionado e deles retirado aproveitamento político e que teria mesmo sido responsável pelo desvirtuamento da qualidade e da verdade etnográfica que muitos deles apresentavam. A  falta de prova e a absurdidade de algumas dessas asserções, não autoriza a sua aceitação. Aliás, a permanência desse desvirtuamento em numerosos desses agrupamentos na actualidade, mais de quarenta anos depois da queda desse regime, demonstra, só por si, a desrazão de afirmações desse teor.

Depois da revolução de 1974, os ranchos folclóricos foram considerados pelos sectores políticos de esquerda, como coniventes do regime deposto, ou pelo menos como representantes de um passado que seria necessário apagar da memória (ainda hoje assim os consideram). Paradoxalmente, de então para cá veio a crescer o interesse em torno das tradições populares e aumentou o número de grupos dedicados à representação folclórica.

A antropologia marxista, ou tardo-marxista, continua, não obstante, afirmando que o Estado Novo estabeleceu mesmo um modelo de rancho folclórico essencialmente baseado nos ranchos minhotos que se teria expandido por todo o território nacional e teria determinado o desvirtuamento, por parte destes agrupamentos, da realidade etnográfica e folclórica, com a intenção de criar uma aparência de alegria e felicidade popular, para alienação do povo e com outros intuitos maléficos.

Trata-se, naturalmente, de uma versão inquinada por razões políticas e por isso despicienda. Deverá, em contra, salientar-se que a situação dos ranchos de representação folclórica resultou, ao longo do tempo, das suas próprias opções, na maioria ditadas pelo espírito bairrista que presidiu à sua fundação e que tem permanecido na mentalidade da maior parte deles.

Aliás, a própria etnomusicóloga Salwa Castelo-Branco e os seus colaboradores José Soares Neves e Maria João Lima, após a realização de um inquérito nacional, reconheceram esta coisa curiosa:  Ao contrário do que se previa (entenda-se: os investigadores já tinham, antes da investigação, uma opinião/previsão sobre os futuros resultados) o modelo de representação de tradições locais formalizado e institucionalizado pelo regime salazarista teve um grande incremento após o 25 de Abril de 1974. Esta conclusão significa inquestionavelmente que tal “modelo” não foi imposto, antes querido pelos ranchos de representação folclórica, que o continuaram, aliás, a querer e a adoptar mesmo depois do golpe militar que depôs aquele regime.

Os mesmos investigadores produzem uma outra afirmação importante: O fenómeno folclórico tem sido frequentemente atribuído à política cultural do Estado Novo e os grupos folclóricos fundados no princípio do séc. XX no Alto Minho têm sido referidos como o seu modelo inicial. Os resultados do inquérito relativizam tais afirmações, remetendo para o último quartel do séc. XIX a fundação dos primeiros grupos (…). A palavra “relativizam” é, como se depreende, um eufemismo para “desmentem”.

Aliás, no mesmo livro Vozes do Povo, Vera Marques Alves, em estudo intitulado “O SNI e os ranchos folclóricos”, chega à conclusão, aliás consabida, de que a política cultural deste organismo não se dirigiu inicialmente à actividade, ou apoio de ranchos folclóricos, mas sobretudo a recriações eruditas  da cultura popular, que vieram a culminar na formação do bailado “Verde Gaio”. E mesmo quando, já nos finais dos anos 40, se dedica mais aos ranchos folclóricos, as indicações reveladas pela autora sobre os mesmos mostram-nos  inequivocamente a preocupação do sub-director do SNI com a autenticidade musical e coreográfica, com a representatividade regional dos trajos, enfim com aquilo a que chamava pureza etnográfica, preservada das influências espúrias da cidade e do cosmopolitismo, chegando mesmo a afirmar que poucos ranchos folclóricos possuíam essas qualidades para representarem condignamente as tradições genuínas das suas terras ou freguesias, em suma a alma do povo, idealização romântica procedente do séc. XIX, que atravessou o período da I República e que se mantinha então ainda muito presente.

Ainda no mesmo livro, Pedro Félix, no seu artigo sobre  “O concurso A Aldeia mais portuguesa de Portugal”, revela que este concurso era encarado como parte da obra de renascimento folclórico e etnográfico nacional e que se destinava a promover o povo e as aldeias que melhor tivessem conservado intactos na sua pureza e graça os costumes tradicionais da sua terra. No seu regulamento estipulava-se que a avaliação para a atribuição do galardão deveria levar em conta a maior resistência a decomposições e influências estranhas, bem como a conservação no mais elevado grau de pureza das características tradicionais, no que concretamente respeitava, entre outros elementos, à habitação, mobiliário, alfaias domésticas, trajo, artes e indústrias populares, poesia, contos, superstições, jogos, canto, música, coreografia, teatro, festas e outras usanças. Significa isto  que as intenções da organização do concurso eram favoráveis à conservação e respeito pelas tradições populares.

As críticas aos problemas de adulteração desde muito cedo acompanharam, no entanto, os ranchos folclóricos, destacando-se neste particular a figura e o pensamento de Fernando Lopes Graça. Tais críticas sempre se basearam essencialmente nas seguintes situações: formas coreográficas inventadas pelos ensaiadores; escolha de trajo uniformizado estranho à tradição popular; textos poéticos da autoria dos seus elementos (dirigentes ou ensaiadores); músicas de criação recente, semi-erudita, não tradicionalizadas, procurando a simplicidade e ignorando as formas musicais mais arcaicas; interpretação com andamento musical muito acelerado e passos coreográficos saltitantes e vistosos, a apelar aos aplausos da assistência.

Nos anos 80, o Inatel e a Federação do Folclore Português (então dirigida por Augusto Gomes dos Santos) procuraram, cada um com as suas características e seus meios, lutar contra essa adulteração. Distinguiu-se a figura e a acção de Tomaz Ribas, à frente do Gabinete de Etnografia do INATEL, que conseguiu congregar especialistas sobre a dança folclórica, a música tradicional, a literatura oral, o trajo popular (e outros temas) e com eles organizar estágios de formação e reciclagem para dirigentes dos ranchos folclóricos, que produziram efeitos muito positivos, consciencializando os seus dirigentes para a necessidade e importância de representarem fielmente a tradição popular e a sua vivência. Enquanto ele ministrava o tema da coreografia popular, os seus colaboradores durante muitos anos foram: Madalena Ferrajota (trajo popular), José Alberto Sardinha (música tradicional e instrumentos musicais), Pedro Ferré (literatura oral), Mesquitela Lima (antropologia cultural).

O termo rancho para designar estes agrupamentos não resultou apenas das expressões utilizadas relativamente aos grandes movimentos de trabalhadores rurais (ranchos da azeitona, da vindima, etc.), mas também, ou mesmo sobretudo, da designação popular das rusgas oriundas das aldeias em direcção aos locais de romaria (rancho da freguesia tal, ou tal), ou exibindo-se nas festas do concelho (rancho ou ranchada da freguesia, ou aldeia tal, ou tal), bem como da denominação genérica de “rancho” para designar um conjunto de populares interpretando música e dança ao som de instrumentos musicais (v. g., rancho das solteiras e rancho das casadas cantando ao adufe nas festas de S. João – Beira Baixa).

Tendo-se extinguido as formas tradicionais de bailar nas aldeias e nos meios populares em geral, os ranchos de representação folclórica são hoje os depositários e intérpretes dessas tradições músico-coreográficas, devendo porém ressalvar-se que muitos deles continuam exibindo formas coreográficas inventadas e músicas não tradicionais. Para não suscitar confusão com o verdadeiro sentido do termo “folclore” (vide), correcto será designar os ranchos folclóricos preferencialmente por ranchos de representação folclórica, visto que o seu objectivo é efectivamente uma representação, em palco, daquilo que era uma real tradição popular e que, extinguindo-se no seu meio natural, passou a ser interpretada em novos contextos, para exibição pública.

Mais: Da música e da dança como formas de expressão espontâneas populares aos ranchos folclóricos, de Jorge Dias; Enciclopédia da Música em Portugal no século XX, Dir. de Salwa Castelo-Branco (entrada Rancho Folclórico); Braga na Tradição Musical – a Rusga de S. Vicente, de José Alberto Sardinha, p. 15 a 33; “Perfis dos grupos de música tradicional em Portugal em finais do séc. XX”, de Salwa Castelo-Branco, José Soares Neves e Maria João Lima, in Vozes do Povo – a folclorização em Portugal.

N. B. – OS TEXTOS DESTA ENCICLOPÉDIA DAS TRADIÇÕES POPULARES ESTÃO SUJEITOS A DIREITOS DE AUTOR, PELO QUE A SUA REPRODUÇÃO, AINDA QUE PARCIAL, DEVERÁ INDICAR O NOME DO SEU AUTOR, JOSÉ ALBERTO SARDINHA.